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segunda-feira, 26 de maio de 2014

Unificação das polícias divide militares e civis

Proposta de emenda à Constituição que estabelece a desmilitarização da PM preocupa entidades ligadas à Corporação, que temem prejuízo para o sistema de segurança pública

Policiais militares em ação na capital mineira: se vingar a PEC que está para ser votada no Senado, estados terão de reestruturar as forças de segurança pública

Uma polêmica proposta em tramitação no Senado vem movimentando batalhões de todo o país e colocando em lados opostos oficiais e praças: a chamada desmilitarização da Polícia Militar. O texto é de autoria do senador Lindbergh Farias (PT-SP) e altera a Constituição Federal de forma a reorganizar a PM no que diz respeito à formação e ao treinamento dos policiais e, principalmente, a acabar com a rigidez da instituição, dando maior autonomia para os profissionais. Na prática, se o projeto for aprovado sem modificações pela maioria dos 81 senadores, caberá a cada estado unificar as hoje existentes PM e Polícia Civil, criando um novo grupo – de natureza civil – para atuar de forma ostensiva, preventiva e investigativa.

A justificativa do autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 51 é que os “vícios da arquitetura constitucional” da segurança pública contribuem para o quadro “calamitoso” do setor no Brasil. “O ciclo da atividade policial é fracionado – as tarefas de policiamento ostensivo, prevenindo delitos, e de investigação de crimes são distribuídas a órgãos diferentes. A função de policiar as ruas é exclusiva de uma estrutura militarizada, força de reserva do Exército – a Polícia Militar –, formada, treinada e organizada para combater o inimigo, e não para proteger o cidadão”, alega o senador Lindbergh Farias, para quem a desmilitarização da PM e a repactuação das responsabilidades vai gerar uma atuação de forma “mais humanizada” e romper com o “quadro dramático” da segurança no país.

Mas não é o que pensa o presidente da Federação Nacional das Entidades de Oficiais Militares Estaduais (Feneme), coronel Marlon Jorge Teza. Para ele, a PEC desconstitui o sistema de segurança pública, ao deixar nas mãos de cada estado a tarefa de montar o seu sistema policial, e ainda ignora um dos principais gargalos do setor: a definição de um percentual mínimo da receita para o seu financiamento, assim como acontece na saúde e na educação. Ele lembra ainda que há várias décadas vem sendo discutida a unificação das polícias, e a ideia sempre fica no papel por falta de consenso. “Nenhum país tem uma polícia única. A divisão é que garante o equilíbrio do estado democrático. Com a unificação, a sociedade fica refém de uma só polícia.”

Outro ponto questionado pelo coronel é o polêmico regime hierárquico dentro dos batalhões, que deixaria de existir. “Nas polícias de grande porte, que é a PM de todo o país, você tem que manter a ordem de um grande efetivo. Isso é diferente de ter meia dúzia de policiais trabalhando em uma delegacia. Não há como manter um efetivo forte sem hierarquia. Corre-se o risco de, no futuro, termos uma verdadeira balbúrdia”, alerta o coronel reformado da PM de Santa Catarina. Integrante da Comissão Nacional de Segurança Pública – grupo vinculado ao Ministério da Justiça –, o coronel Marlon Jorge diz que já participou de reuniões no Senado em que tentou convencer os senadores de que é preciso um melhor debate sobre o assunto.

A Associação Nacional dos Militares do Brasil (ANMB) – entidade que engloba homens da PM e Forças Armadas – não acredita que a PEC vá trazer reflexos práticos para a segurança dos brasileiros. Mas vai fazer diferença para o Exército. É que a PM e o Corpo de Bombeiros fazem parte do quadro de reserva das Forças Armadas. “Se desmilitarizarem a PM, vamos perder o controle disso e ainda enfraquecer o Exército”, pondera o presidente da ANMB e sargento reformado do Exército Marcelo Machado. Para ele, ainda é preciso ficar mais claro como será a estrutura de cargos, funções e hierarquia dentro da polícia unificada. “Isso deve ser definido antes da aprovação da PEC”, argumenta.

Parceiros

Representantes da Polícia Civil mineira são favoráveis à unificações. Pelo menos o Sindicato dos Servidores da Polícia Civil (Sindipol). O presidente da entidade, Denilson Martins, argumenta que uma carreira única significará redução do gasto público e mais eficiência das polícias. “Proteger e servir os cidadãos não é uma política da PM. A doutrina dela é obedecer o comando. Com a unificação, você muda a ótica para a prestação do serviço”, acredita Martins, que é investigador da Polícia Civil. De acordo com ele, o trabalho poderá ser dividido com um segmento voltado para a prevenção ostensiva e outro para a investigação dos crimes. “Hoje temos dois institutos que deveriam ser parceiros, e não são”, diz. O comando da PM foi procurado pela reportagem para comentar o assunto, mas preferiu não se manifestar.

Enquete

O Senado realizou entre os dias 5 e 15 de maio, em seu site, uma enquete sobre a desmilitarização da PM. Recebeu no total 98.648 votos. Desses, 54% disseram que são contra a mudança e 46% a favor. Além da divulgação feita pelo Senado, a enquete foi amplamente disseminada por internautas que se mobilizaram em blogs e redes sociais. O participante foi submetido à seguinte pergunta: “Você é a favor ou contra a proposta que desmilitariza o modelo policial, convertendo as atuais polícias Civil e Militar em uma só, de natureza civil?”

O que diz a PEC 51

» Todo órgão policial deverá se organizar em ciclo completo, responsabilizando-se cumulativamente pelas tarefas ostensivas, preventivas, investigativas e de persecução criminal. A carreira deverá ser única.

» Os estados e o Distrito Federal terão autonomia para estruturar seus órgãos de segurança pública, inclusive quanto à definição da responsabilidade do município

A proposta apresenta dois modelos de polícias

» Polícia municipal: responsável por atuar apenas contra crimes de pequeno potencial ostensivo no município

» Polícia unificada civil estadual: responsável pela segurança de toda a população do estado, atuando contra todo tipo de criminalidade e infração, exceto nos crimes cobertos pela polícia municipal, onde houver. (em.com.br)



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