Artigo originalmente publicado no Observatório da Imprensa
Por Robson Sávio Reis Souza
[A mídia] "quando se apropria, divulga, espetaculariza, sensacionaliza ou banaliza os atos
de violência está atribuindo-lhes um sentido que, ao circularem socialmente, induzem
práticas referidas à violência. Se a violência é linguagem – forma de comunicar algo -, a
mídia ao reportar os atos de violência surge como ação amplificadora desta linguagem
primeira, a da violência" (RONDELLI, E. Imagens da violência: práticas discursivas.
Tempo Social, S.P, v. 10, n. 2. p. 145-157, out.1998).
Como espectadores, leitores, ouvintes, cidadãos e operadores da segurança pública devemos compreender que a cobertura do cotidiano violento das grandes cidades não é tarefa fácil.
Por trás de eventos violentos outras questões estão ocultas, e dificilmente podem ser contempladas em cada matéria ou reportagem que envolve a abordagem do tema, pela mídia.
Ademais, é mister entendermos que na análise da questão não existe verdade absoluta, nem ponto de vista inquestionável e irrefutável. Neste sentido, os operadores da segurança pública, os especialistas e os jornalistas devem levar em consideração uma série de questões. Afinal, todos esses profissionais têm se debruçado na tentativa de explicações lógicas para um fenômeno múltiplo e complexo. As dificuldades em abordá-lo não justificam, porém, as simplificações e generalizações grosseiras e, muitas vezes, tendenciosas.
Apresentamos, a título de ilustração, uma síntese da complexa teia de fatores intervenientes no fenômeno da violência e criminalidade. Para tanto, usamos o modelo proposto pelo cientista francês Jean-Claude Chesnais, conceituado demógrafo e especialista em violência urbana. Ele traçou um estudo sobre a violência criminal no Brasil, apontando seis causas como fatores responsáveis pela atual situação:
** Fatores sócio-econômicos: miséria, agravamento das desigualdades, herança da hiperinflação;
** Fatores institucionais: insuficiência e incompetência do Estado, crise do modelo familiar, recuo do poder da Igreja;
** Fatores culturais: problemas de integração racial e desordem moral;
** Demografia urbana: as gerações provenientes do período da explosão da taxa de natalidade no Brasil chegando à vida adulta sem muitas referências éticas; e o surgimento de metrópoles, sem a mínima infra-estrutura, que receberem uma fortíssima migração nas últimas décadas;
** A mídia, com seu poder, que colabora para a apologia da violência.
** A globalização mundial, com a contestação da noção de fronteiras; e o crime organizado (narcotráfico, posse e uso de armas de fogo etc.).
Acrescentaria outro fator, característico e específico das grandes cidades brasileiras. A organização do tráfico de drogas (disputas pela ampliação de espaço e poder, guerra entre gangues) e suas conexões com outras modalidades de crimes (contrabando, lavagem de dinheiro, corrupção de agentes públicos etc.).
Ora, fica evidente a complexidade que envolve o fenômeno da violência. E, por conseqüência, a dificuldade, ou a quase impossibilidade, do profissional da comunicação, cobrindo o pontual, abordar todas essas questões na apresentação de cada notícia sobre o tema. Isso sem contar, obviamente, com outras dificuldades de abordagem, como o reduzido espaço ou tempo para apresentar a notícia; as pressões vindas de editores e chefes de redação; os interesses, nem sempre confessáveis, das empresas de comunicação, dentre outros. Ademais, não podemos esquecer da rotina massacrante das redações, que não permite o aperfeiçoamento e o aprendizado contínuo por parte dos profissionais da comunicação.
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