Polícia Comunitária, polícia de preservação da ord
Muito tem se falado na sociedade a respeito da ação policial e em não raras avalancham críticas ferrenhas. Importa-se frisar que entender o verdadeiro papel das polícias militares no Brasil requer dose abundante de parcimônia, conhecimento acurado e visão futurista.
Vale lembrar que nossa Carta Magna (art. 144) assegura direitos individuais e coletivos aos cidadãos brasileiros, em especial à segurança pública, mas as polícias desvirtuam seus papéis e agem em desarmonia ao seu propósito.
Numa vertente questionada e ainda criticada, as polícias brasileiras predominantemente demonstram resistência às mudanças na política de segurança pública, agindo tão somente como cumpridor da Lei e foca sua atuação no infrator e nas conseqüências de sua ação desordeira. Age em reativo à propagação da violência e busca desesperada da contenção do índice de crimes, situação avessa à exigida prática ininterrupta de atividades pró-ativas ao alcance das garantias individuais e coletivas aos cidadãos que vivem num Estado Democrático de Direito. As polícias brasileiras deixam de atuar como polícia de preservação da ordem pública, para atuar predominantemente como polícia de cumprimento da lei.
A sociedade avançou e alcançou mudanças significativas aos padrões de conduta, da valorização da agressividade como fator decisivo à proteção da vida para a cultura aos valores éticos e morais. A crescente desse fenômeno desperta na sociedade a sensação de fragilidade e desproteção, inversamente proporcional na capacidade do Estado em exercer o controle da violência, ao que a sociedade vislumbra.
Para se ter uma idéia, em 1829 na Inglaterra Sir. Robert Peel inicia a então chamada polícia moderna, implanta modelos diferentes que buscavam a visão sistemática em problemas de criminalidade, exigindo da polícia a prevenção ao crime e à desordem. O corpo policial passa a atuar de formar interativa com a sociedade, buscando a cooperação da comunidade, sem desgarrar-se das observâncias da lei, estabelecendo confiança e respeito dos cidadãos.
Os modelos e estudos antigos nos levam (nós policiais militares) a priorizar a vigilância do cumprimento da Lei, focando nossas ações na perseguição, prisão e punição do criminoso (infrator). Noutras palavras esse modelo nos propicia estar sempre um passo atrás, buscando remediar o que já ocorreu.
É de bom alvitre lembrar aos desavisados que, as polícias militares no Brasil dão seus primeiros passos com a chegada da família real portuguesa ao Brasil (isto em 1808), depois de ser expulsa de solo lusitano pela ameaça de invasão das tropas napoleônicas. Naquela época o corpo policial era incumbido das atribuições judiciais com espeque à apuração de delitos ocorridos ao entorno da nobreza, posteriormente no ano seguinte, cria-se uma força policial com atribuições específicas de reprimir a desordem. (percebe-se que as polícias militares tinham a tarefa de proteger a família real portuguesa e seus próximos).
A história tem sido testemunha que a função das polícias brasileiras desde os primórdios foi deturpada e praticada de forma a atender os anseios da nobreza e dos amigos dela, agindo predominantemente repressiva contra os negros e escravos, que à época eram a maioria populacional, desde então já agíamos em busca do controle e restabelecimento da ordem quebrada, já agíamos reparando janelas quebradas e não como agente de preservação da ordem pública a evitar que outras janelas fossem quebradas.
Logo se vê a deturpação da verdadeira identidade e do papel da polícia brasileira, alinhavada na teoria da escola anglo-saxônica, que tem como pressuposto a investigação do delito como forma de prevenção à violência, ação focada no cidadão desalinho aos regramentos. É de bom alvitre salientar que embora a escola anglo-saxônica tenha sua contribuição importante à época, alguns avanços no seio da sociedade força a entidade policial a buscar novo modelo, um paradigma com espeque mais construtivista, servindo de referência a escola oriental que apresenta como pressuposto da prevenção do crime as arestas do triângulo do crime, tendo como foco o agente disposto à ação, o ambiente apropriado e a vítima em potencial, uma abordagem mais globalizada sem correr riscos de se praticar equívocos com requintes de discriminação.
A influência de experiências das polícias estrangeiras (francesa, americana e inglesa) é notória e hoje temos em Mato Grosso a influência da escola japonesa que brilhantemente aplicam seus modelos de policiamento focado no cidadão e interação conjunta: Os kobans (postos policiais convencionais) e os Chusaishos (postos policiais onde o policial reside), embora tenhamos a convicção que estamos longe de atingir essa potencialidade, mas as Bases Comunitárias já operam com certa influência da escola japonesa.
No policiamento comunitário, demonstra-se à sociedade o verdadeiro papel da polícia militar, e de polícia de preservação da ordem pública. Impõe uma mudança comportamental da polícia e exige esforço da sociedade no sentido de aceitação aos novos propósitos que hão de lhe proporcionar dias melhores e qualidade de vida.
A Polícia busca sólida relação com a comunidade, a insere no processo de prevenção criminal com implementação de atividades pró-ativas e projetos sociais que atendam a demanda local, atua a Polícia nas condutas criminosas, porém participa ativamente na recuperação das condições de vida do bairro ou da cidade, podendo servir como órgão intermediador, por ser a presença viva e cristalina do poder público naquela comunidade.
É de bom alvitre salientar que o modelo de polícia comunitária não mitiga e tampouco substitui a atividade policial convencional, apenas apresenta uma mudança atitudinal diária dos policiais e tem sido considerado como a mais significativa redefinição do trabalho policial nos últimos anos.
No modelo de polícia comunitária nas escolas japonesas, americanas e outras, os policiais atuam como “mini-chefes” de polícia descentralizado, interagem com a comunidade e em constante patrulha comunitária, participam ativamente na solução de conflitos locais, procuram minimizar os efeitos dos conflitos, e buscam (junto com a comunidade) tornar a comunidade local melhor para morar, trabalhar e viver.
Portanto não há cabe falar-se que as polícias possuam inimigos, pois estaríamos corroborando ao entendimento já inconcebível de intitulação do cidadão, e permissiva abordagem deturpada da concepção do verdadeiro papel das polícias. Tampouco descabe desmerecer que a ação policial embora ganhe força na legalização do ato praticado por meio das leis, face à flagrante e cristalina legitimização desse ato pela sociedade.
Vivemos num estado democrático de direito em que nossa lei maior assegura direitos individuais e coletivos, símbolo do avanço da sociedade brasileira que ao longo de sua história viveu anos de sofrimento e calada, sem esquecermos o regime de exceção, uma chaga em nossa história.
O modelo de polícia comunitária é uma maneira inovadora e poderosa, com emprego de sua filosofia plena, exigindo a implementação de ações pró-ativas focadas no cidadão, implicando na mudança comportamental do policial e da instituição policial, promovendo e provocando mudanças consideráveis na atuação policial que convoca a sociedade a se engajar e participar do processo, como reza nossa Lex Matter.
Na busca deste mister, o profissional de segurança pública que aceitar o desafio de servir e proteger o cidadão, deve ter uma visão sistêmica de todas as questões que envolvem a deflagração do crime, sua propagação e da violência, deve além de buscar a prevenção incansavelmente, promover ações com espeque na pró-atividade.
Sebastião Carlos Rodrigues Silva
Capitão da Polícia Militar
Comandante da Base Comunitária do MOINHO
Cuiabá-MT
Bacharel em Segurança Pública – UFMT/APMCV
Especialista em Gestão de Segurança Pública – UNEMAT/APMCV